JOAQUIM BARRETO (*)
Celebramos, mais uma vez, o “25 de Abril” de 1974, data marcante na História de Portugal. Há meio século que este dia simboliza a luta pela liberdade, pela democracia, pela justiça social e pelos valores democráticos.
A “Revolução dos Cravos” não foi apenas um momento de mudança política, foi um grito de esperança e o desejo profundo de um futuro melhor para todos os portugueses.
Em 1974, o Povo, cansado de um regime opressivo e autoritário, levantou-se em uníssono. Com cravos vermelhos nas mãos, os cidadãos mostraram ao mundo que a força da vontade popular pode prevalecer sobre a tirania.
A beleza desse simples, mas poderoso gesto, ressoou não apenas em Portugal, mas em todo o Mundo, inspirando movimentos de liberdade e de justiça e transformando-se, assim, esta mudança de regime em Portugal numa das mais “bonitas revoluções” de que há memória.
Comemorar o “25 de Abril” lembra-nos que a luta pela liberdade é um compromisso contínuo e que a democracia é um bem precioso que deve ser protegido e cultivado.
É nossa responsabilidade garantir que os valores da igualdade, da verdade, do respeito, da ética, da seriedade e da solidariedade sejam diariamente defendidos e praticados.
É sabido que a “Revolução dos Cravos” trouxe o fim da ditadura, do Estado Novo e de um regime autoritário que durou mais de 40 anos em Portugal. Restabeleceu a democracia e trouxe-nos a liberdade de expressão e a livre circulação de ideias.
Desde então, os Direitos Humanos passaram a ser defendidos e os trabalhadores passaram a ter direitos, sindicatos e proteção laboral.
A descolonização levou à independência de países como Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe.
Foram implementadas reformas sociais, na educação, na saúde, na justiça, entre outros setores, para combater as desigualdades.
A democratização do país incentivou a participação cívica e política, assim como a realização de eleições livres e justas. E a nova Constituição, aprovada em 1976, consagrou os direitos e liberdades fundamentais, estabelecendo as bases para a democracia em Portugal.
50 anos depois
Mas, volvidos que são 50 anos após o “25 de Abril de 1974”, desenham-se no horizonte pensamentos negacionistas, populistas, misóginos, que põem em causa as lutas travadas, as conquistas e os direitos alcançados em sociedades modernas e desenvolvidas.
Não podemos, por isso, fazer tábua rasa do nosso passado, marcado pela ditadura, pela censura, pela falta de liberdades civis e por uma política agressiva que levou milhares de portugueses para a guerra colonial.
Não podemos esquecer o Movimento das Forças Armadas. A partir de 1970, um grupo de oficiais composto por audazes militares descontentes com a guerra colonial e a repressão política, começou a organizar-se em torno da ideia de derrubar o regime e a queda do Estado Novo. Refiro-me aos “Capitães de Abril”, mas também aos antifascistas, aos movimentos académicos e a tantos e tantos corajosos anónimos que, aquém e além-fronteiras, lutaram pela nossa liberdade.
Não podemos esquecer as vítimas do fascismo, da Pide, e a miséria em que o povo vivia. É por tudo isso que o espírito do “25 de Abril” deve continuar a inspirar-nos, a agir, a questionar e a lutar por um futuro onde a liberdade e a dignidade humana sejam garantidas para todos.
Mas se enaltecer este dia é lembrar o passado, é também, sobretudo, refletir sobre os desafios que diariamente enfrentamos. Meio século depois, a luta pela justiça social, pela igualdade de oportunidades e pelos direitos humanos continua e, por isso, é fundamental que cada um de nós se envolva ativamente na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, onde todos tenhamos voz e vez.
Não tenhamos medo, nem condicionemos os pensamentos e as vozes diferentes. Toda a liberdade é inquietação. É ação. É uma luta constante. É voz ativa e sentido crítico!
Poder Local, importante conquista
O poder local democrático, de que orgulhosamente somos parte, é uma das mais importantes conquistas de Abril. Aproxima-nos dos cidadãos. Descentraliza, promove a participação ativa e uma maior responsabilidade que facilita a identificação e uma resposta mais rápida, eficaz e transparente aos problemas. Permite implementar políticas e programas inovadores em prol das pessoas e de uma sociedade mais coesa.
O poder local democrático constrói caminhos, fomenta o desenvolvimento sustentável e fortalece as comunidades, tornando-as mais resilientes e preparadas para enfrentar crises e desafios.
Prova disso é o nosso concelho, cujos índices de bem-estar foram subindo paulatinamente no pós-“25 de Abril”, com a construção de infraestruturas e de equipamentos, com a abertura de serviços ou com a implementação de políticas que foram dando resposta aos problemas mais prementes das populações.
E permitam-me que abra aqui um parêntesis para enaltecer todos aqueles que nos ajudam a crescer, desde o mais simples colaborador deste Município e ao cidadão comum, até aos governantes que partilharam e partilham dos nossos sonhos, ajudam e ajudaram a concretizá-los, como foi o caso do eng.º João Cravinho, recentemente falecido, mas cuja ação deixou importantes marcas neste concelho e no país. Um homem vertical, que pautava a sua ação por princípios e valores. Um governante com enormes competências técnicas e políticas. Um visionário, sempre próximo das pessoas.
Dinamizar Cabeceiras
Mas, dizia eu, as sociedades evoluem, as pessoas estão mais exigentes e os problemas de outrora não são mais os mesmos. É preciso corresponder no dia-a-dia aos anseios de quem em nós confiou. Essa é a nossa missão. Não podemos defraudar aqueles que teimam em ficar na nossa terra e aqui querem desenvolver os seus projetos de vida.
Temos de criar respostas, temos de inovar, temos de dinamizar Cabeceiras de Basto e continuar a fazer desta terra um local onde todos gostem de viver e de visitar.
A beleza do poder local democrático está na capacidade de realizar e de transformar para melhorar a vida dos nossos concidadãos, contribuindo deste modo para moldar o Portugal moderno em que vivemos, com algumas debilidades, é certo, mas seguramente com muitos mais aspetos positivos.
É por isso que celebrar anualmente o “25 de Abril” é avivar a memória e a importância da liberdade e da democracia, cada vez mais assombrada por movimentos populistas e autoritários, no mundo, na Europa e também em Portugal.
O aumento das desigualdades socio-económicas geram descontentamento, desconfiança e instabilidade política. As ameaças à liberdade de expressão, a radicalização, as crises económicas, a apatia e o desinteresse da população em relação à política, podem resultar numa menor participação cívica, enfraquecendo, assim, a nossa democracia.
As tensões socio-económicas, ambientais, políticas entre outras, cada vez mais frequentes, colocam em risco os valores democráticos e exigem respostas que respeitem os direitos humanos e a justiça social.
É fundamental que a sociedade civil, as instituições e os cidadãos permaneçam vigilantes e ativos na defesa da democracia e dos direitos conquistados, promovendo o diálogo, a educação cívica e a participação política, para ajudar a fortalecer a democracia e a liberdade e garantir que os direitos conquistados sejam preservados para as futuras gerações.
Como diria D. José Tolentino Mendonça, «não podemos olhar para este momento apenas como um parêntesis, como uma suspensão, e depois vamos voltar a viver tudo o que vivíamos – isso não é ajustado à realidade. Temos de encontrar novas linguagens; este tempo é um laboratório. E temos de ouvir o futuro, que já está aqui, porque, como diz Santo Agostinho, há um presente do futuro».
Se há coisa a aprender com os tempos estranhos em que vivemos é a fragilidade dos sistemas, que não são, mas que nos parecem, sólidos. Abril é mais urgente do que nunca.
Não basta festejar a efeméride. Não basta colocar o cravo ao peito uma vez por ano. É preciso praticar “Abril”, com ações, com gestos, com educação e com respeito. No nosso caso, autarcas que somos, é preciso cumprir todos os dias o prometido, falar verdade, agir e ter sempre em conta que o poder é efémero e que o povo é quem mais ordena. É preciso acordar. Estar alerta e manter a democracia forte, com a intervenção de todos, sem exceção, pois só assim podemos continuar a liberdade. Se há algo que devemos celebrar com “Abril” é a possibilidade de participar no futuro, de forma atenta e informada. A liberdade é feita por todos e para todos.
É importante prosseguir a defesa e a prática dos ideais de “Abril”, da liberdade, da igualdade e de solidariedade, dando espaço, voz e coragem à insatisfação e às justas reivindicações daqueles que pugnam e nos desafiam para uma participação ativa na construção do bem comum.
Viva o “25 de Abril”! Viva a liberdade! Viva Cabeceiras de Basto!
(*) Presidente da Assembleia Municipal de Cabeceiras de Basto; intervenção feita esta sexta-feira (25) na sessão comemorativa do “25 de Abril”.

