Terça-feira, Março 11, 2025
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Cabeceiras: candidato socialista dispensa histórico Joaquim Barreto

Esta foi a semana em que rompeu, fatalmente, o pequeno fio que sustentava a relação entre os presidentes da assembleia e da câmara de Cabeceiras de Basto, um processo que foi evoluindo ao longo do mandato e que teve o seu ponto alto quando o líder do executivo, Francisco Alves, fez questão de não integrar a delegação partidária que formalizou o convite à próxima recandidatura do líder do órgão deliberativo, Joaquim Barreto.

Num recontro final, que mais não pretendeu do que romper completamente a relação entre ambos, o presidente da câmara fez agora questão de provocar ostensivamente o seu histórico camarada de partido, aproveitando para o efeito o processo de desagregação da União de Freguesias de Refojos, Outeiro e Painzela, concretamente a deslocação de uma comitiva para assistir na Assembleia da República à votação final da respetiva lei.

Num processo que envolve trabalho de advogados e a troca de comunicações escritas entre os dois, Francisco Alves faz questão de mostrar a Joaquim Barreto que não conta com ele para as próximas eleições autárquicas, assim se cumprindo o que o Terras de Basto tem escrito, concretamente que Alves, em detrimento da relação com Barreto, prefere desde há longo tempo a cumplicidade dos dois vereadores do movimento de cidadãos “IPC”, que lhe têm aprovado os orçamentos e as principais deliberações ao longo de todo o mandato.

O atribulado processo que agora alimenta esta fatal rutura tem o seu epicentro num procedimento interno que levou o presidente da câmara a bloquear o pagamento de uma estadia à comitiva que se deslocou ao parlamento a 17de janeiro, argumentando justificações para o não cumprimento das «suas obrigações legais», visto que a competência para a assunção de tal despesa – um ajuste direto de 1.390 euros – é do presidente da assembleia.

«Alerta-se V. ª Ex.ª de que, caso mantenha a obstaculização ao cumprimento das obrigações financeiras municipais, corporizadas na assunção de despesas legais e legítimas da assembleia municipal, devo sublinhar que, sem embargo de ponderar o recurso às necessárias participações junto das instâncias competentes para apreciação de tal comportamento nas suas várias vertentes, será V.ª Ex.ª o único responsável pelo pagamento de eventuais juros exigidos pela entidade prestadora do serviço». Este é o teor de um dos últimos parágrafos enviados por Joaquim Barreto a 14 de fevereiro para se defender da missiva que Francisco Alves lhe enviara dois dias antes.

Alertava ainda aquele que durante 20 anos presidiu à autarquia – considerado o mais proeminente e reconhecido socialista do concelho – que, quanto à «persistente recusa dos serviços técnicos» em dar cumprimento aos seus despachos, eles poderão estar «a praticar uma infração disciplinar», «entendida como o comportamento do trabalhador, por ação ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole deveres gerais inerentes à função que exerce».

A 12 de fevereiro, o presidente da câmara havia enviado ao seu homólogo do órgão colegial – que se reúne esta sexta-feira (21) – uma missiva em que se dizia «legalmente impedido de promover o andamento do processo» — o pagamento dos 1.390 euros –, alegando que a decisão formal por este instruída não continha «todos os elementos legalmente necessários».

Esta missiva trazia anexo um parecer jurídico do gabinete contratado pelo município, que pretendia sustentar o afirmado, parecer que esquecia, contudo, que – neste mesmo contexto e com o mesmo procedimento — o presidente da câmara dera já andamento ao pagamento dos 1.250 euros referentes ao transporte da mesma comitiva.

Nesta sua última carta ao líder do executivo, o presidente da assembleia lembrara-lhe que, «cumprindo o protocolo habitual instituído há mais de onze anos» entre os dois órgãos municipais, havia sido enviado à câmara uma mensagem eletrónica com a indicação para a requisição e pagamento dos encargos realizados com a aquisição dos dois serviços: transporte e estadia.

«Estranha-se que, pela funcionária da câmara municipal designada para acompanhar este relacionamento institucional entre os dois órgãos do município, tenha sido aceite e encaminhado para prosseguimento de pagamento a despesa relativa ao transporte e, pela mesma, recusado o prosseguimento da requisição para pagamento da despesa relativa ao alojamento, uma vez que não se vislumbra nenhuma diferença no enquadramento e tratamento a dar a essas duas despesas», explicitava Barreto, admitindo que tal atitude obrigava a admitir que «ou esteve mal o pagamento relativo à despesa do transporte ou está mal a recusa que se vem fazendo à requisição para o pagamento da despesa relativa ao alojamento».

Terminava o presidente da assembleia a sustentar que «o comportamento que vem sendo adotado neste caso» por parte do presidente da câmara, «de distorção exigência de formalismos a que a própria lei não obriga», não pode deixar de ser considerado como «uma tentativa, consciente, de obstrução ao desenvolvimento das competências cometidas à assembleia municipal e seu presidente». «A intromissão de V.ª Ex.ª nas decisões por mim tomadas configura um caso de usurpação de poderes, configurando a violação do princípio da separação de poderes», dizia-lhe ainda.

A questão de fundo

«Mais do que desadequada e ilegítima, a atitude tomada — de impedir, desconsiderar e desautorizar o presidente da Assembleia Municipal e o órgão a que preside de exercer as suas competências, previstas na lei – constitui uma ingerência a todos os títulos inaceitável e até condenável no normal funcionamento da Assembleia Municipal». Foi nestes termos que Joaquim Barreto se referiu numa primeira carta enviada a 3 de fevereiro a Francisco Alves.

A despesa dos 1.390 euros, relativa à estadia de uma noite, para que as três dezenas de participantes pudessem aceder, em tempo, às galerias do parlamento, que estiveram lotadas nesse dia, com mais de mil pessoas – fora autorizada pelo presidente da assembleia municipal, no uso das suas competências.

Num “dossier” que acompanhava essa primeira carta, em que se historiava o processo e sublinhava «a necessidade  urgente» de que fossem dadas indicações aos serviços municipais para que regularizar a situação junto da empresa prestadora do serviço, o presidente da assembleia sublinhava que a deslocação da comitiva – membros da mesa da assembleia, do executivo municipal e dos órgãos da união de freguesias: os implicados nas várias aprovações unânimes da proposta de desagregação – tinha «o maior significado e importância política e pública para o concelho, já que esta matéria foi decidida por unanimidade em todos os órgãos autárquicos e a sua aprovação era uma aspiração legítima das populações» de Refojos, Outeiro e Painzela.

Embora o procedimento interno, a tramitar desde 3 de janeiro, se perca em argumentações do foro legal – processo em que, além dos políticos, foi envolvida uma técnica superior, que considerou por escrito, embora sem o sustentar, que, «por inexistência de base legal», o procedimento para pagamento da estadia não podia prosseguir; apesar de ter aceite já o mesmo enquadramento de lei para o pagamento do transporte, no valor de 1.250 euros –, a questão de fundo ultrapassa as burocracias administrativas, as razões legais e os advogados entretanto envolvidos, isto para ganhar dimensão política: a hostilidade do presidente da câmara ao presidente da assembleia, particularmente evidente no que se refere a este processo de desagregação das três freguesias cabeceirenses.

Não tendo nutrido nunca simpatia pelo processo de desagregação em causa, o presidente da câmara tem-se mostrado hostil perante os seus mais diretos promotores – além do presidente da assembleia municipal, os presidentes da junta e da assembleia da união de freguesias –, numa atitude que remete para os tempos do início do atual mandato autárquico, 100 dias depois das eleições, quando o presidente-eleito para a junta estabeleceu um acordo de governabilidade com o candidato do movimento de cidadãos “IPC”, que assumiu a presidência da assembleia, cenário que se manteve com sucesso até aos dias de hoje.

Embora, por força das circunstâncias, tenha apadrinhado este acordo que viabilizou a gestão da autarquia local, o presidente da câmara prefere hoje negar tal facto, tudo tendo feito, mormente na segunda parte do mandato, para o seu insucesso, pretendendo com isso agradar aos dirigentes do “IPC”, que nunca aceitaram o teor daquele acordo, alegadamente feito à sua revelia pelo seu candidato, de cujo apoio os resultados eleitorais deixaram o candidato socialista dependente.

Naquela circunstância pós-eleições, depois de várias tentativas para viabilizar os órgãos autárquicos da união de freguesias, os dirigentes do “IPC” almejavam trocar desiderato por um lugar na vereação, conforme foi várias vezes tornado público e nunca desmentido.

Também dependente dos dois vereadores do “IPC”, designadamente para a aprovação dos orçamentos e das mais relevantes deliberações municipais, o presidente da câmara passou a estabelecer com eles uma estreia relação ao longo do mandato, governando o município com a sua total cumplicidade, o que torna agora provável um, formal ou informal, acordo de incidência eleitoral, que permita, designadamente, o regresso de alguns ex-socialistas ao partido e a sua simultânea candidatura em nome do PS.

Comentada, neste contexto, e nunca desmentida, tem sido a eventualidade de o primeiro vereador do “IPC” poder assumir a candidatura do PS à assembleia municipal e de o segundo vereador vir a integrar a lista socialista à câmara em lugar elegível.

É, assim, neste contexto que acontece a rutura entre os dois socialistas de maior relevo na autarquia cabeceirense, sendo que o presidente da assembleia municipal não respondeu ainda ao convite que o partido lhe fez para se recandidatar, convite a que o presidente da câmara já não quis ficar associado, não tendo participado no momento em que ele foi formalizado pelo líder da concelhia do PS.

O Terras de Basto tentou obter reações dos dois mais diretos intervenientes: através do seu chefe de gabinete, o presidente da câmara mandou responder «que não tem tempo para dar entrevista», mas que o jornalista poderia formular as perguntas por escrito, «que a seu tempo serão respondidas»; já o presidente da assembleia respondeu que «preferia não tecer, para já, considerações públicas» sobre o assunto. [JPM].

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